Os Amores Difíceis | Italo Calvino

Uma coletânea de contos de Italo Calvino escritos entre 1949 e 1967 ilustram a evolução da sua escrita. Inicialmente explora o lado mais mecânico da narrativa, dedicando uma excessiva atenção à descrição dos pormenores. No primeiro conto, desenvolve a forma como o soldado se esforça por tocar na passageira que segue a seu lado, uma matrona que não reage, deixando pairar a dúvida se pretende encorajar o magala ou, simplesmente, não se apercebe do jogo.

 

No conto da banhista que perde o fato de banho, temos mais uma vez as fronteiras proibidas do corpo; o gesto de esconder a nudez substitui a mão atrevida do magala que dissimula explorar intimidades com a passageira do lado. A ausência de interação do outro ou dos outros permite ao autor explorar os limites da sua escrita e,  com mestria, desafiar a verosimilhança ao longo da narrativa.

Quatro anos mais tarde, no A aventura de um empregado, encontramos um discurso mais solto, pairando em torno das circunstâncias ocasionais ou forçadas; como neste caso, representado pelo ardil da senhora lindíssima que se deixa conquistar. Os personagens já não assumem mais a pose estática de modelo que atribuiu à matrona do primeiro conto. Apesar da experiência acumulada com os anos, a escrita não abandona um certo grau de experimentalismo, como se o conto fosse um balão de ensaio, um local propício a explorar todas as direções em que uma narrativa se pode lançar – como as extensas e exaustivas reflexões do fotógrafo amador.

Italo Calvino pretende esgotar uma ideia até ao exagero do seu absurdo, testando os limites da narrativa e do leitor. Filtrar os exercícios de escrita como um decantar do azul da águae surpreender-nos com o mundo que, nos mestres, habita para além da palavra.

parecia-lhe ali na informe confusão da vida estaria escondida a linha secreta, a harmonia, só localizável pela rapariga azul-celeste, e que seria este o milagre dela, o de escolher a cada instante no caos dos mil movimentos possíveis aquele e só aquele que era certo e límpido e leve e necessário, aquele gesto e só aquele, no meio de mil gestos perdidos, que contava.

sobre o livro

 

Advertisement